sábado, 11 de outubro de 2008
Deus não é racista (Pastor Gottfried Brakemeier)
"Os radicalismos de direita estão de volta. Criam manchetes as manifestações neo-nazistas na Alemanha. Mas também em outros países (a exemplo da Itália, Espanha, etc) crescem os grupos simpatizantes com a ideologia fascista propagadora da discriminação racial. Nem mesmo o Brasil pode excluir-se. Predominantemente negros, judeus e nordestinos tornam-se vítimas da perseguição racista que recrudesce na sociedade.
A constatação dessa tendência nefasta faz com que a Igreja traga a público uma palavra que expresse sua inconformidade e o seu alerta. Compete à Igreja de Jesus Cristo, comprometida com o serviço à vida e engajada em ampliar os espaços da fé, da esperança e do amor, denunciar o que destrói a paz e fere os direitos de Deus. Entre as grandes ameaças da atualidade está, não por último, a obsessão racista.
Certamente, o racismo não é novidade no Brasil. Marca presença na história da nação desde os tempos em que o índio e o negro foram reduzidos à condição de escravos. É bem verdade que a sociedade brasileira jamais tem amargado conflitos racistas sangrentos análogos aos que houve e ainda há na África do Sul e mesmo nos Estados Unidos da América. Com alguma razão o Brasil se orgulha de ser um país pluri-étnico, permitindo a cada grupo a expressão de sua respectiva cultura. E todavia, não deixam de ser realidade os sinais de racismo camuflado ou aberto, submerso e ainda flagrante. Eles preocupam e exigem a resistência.
Isto é particularmente verdade quando o racismo deixa de ser ingênuo e se apóia numa teoria que supostamente o justifica. É o que acontece não somente no sistema do "apartheid" conhecido na África do Sul mas também no neo-facismo de nossos dias. Parte do pressuposto de uma hierarquia das raças, enxerga na diferença uma ameaça, e prega uma militância racial que costuma incluir a permissão para o uso da violência. Boa parte dos conflitos armados da atualidade, como aquele da Bósnia, tem ingredientes étnico-racistas. A convivência pacífica das raças, etnias e culturas se coloca mais uma vez como urgência a ser atendida.
Do ponto de vista cristão não há como justificar racismo de qualquer tipo. Deus criou um mundo multiforme, em que cada "peça" tem sua característica inconfundível. Diversidade é a marca da criação. Mas é uma diversidade na mesma dignidade. Nenhum ser humano, por pertencer a outra raça, cultura ou sexo, é inferior ou menos valioso. O propósito de Deus não está na segregação de grupos e categorias humanas e, sim, na complementação de uns pelos outros e no serviço mútuo, usando cada qual o dom que recebeu. Discriminação racial equivale a desprezo ao Deus Criador, que moldou a criação assim como a fez e que por amor a ele deu seu Filho Unigênito. Resulta daí o compromisso com a meta da parceria fraternal entre raças, povos e culturas.
É um compromisso válido para todos, independentemente de seu credo. Baseia-se, não por último, no que é óbvio: violência cria tão-somente violência. Ódio é o início do assassinato. Opressão provoca reação. Seja o radicalismo de direita, seja o de esquerda, desde que preconizador de meios violentos e de brutal dominação de uns sobre os outros, vai produzir o inferno da guerra civil e uma "cultura da violência", em que todos são vítimas potenciais. Cria-se um clima generalizado de terror. O racismo é uma das forças que na história humana responde por indivisível sofrimento.
Entre as manifestações históricas do racismo, o anti-semitismo (o ódio aos judeus) tem desempenhado papel essencialmente hediondo. A profanação de cemitérios judaicos em nossos dias e manifestações correspondentes acusam o redespertar do espírito demoníaco responsável pelo holocausto do povo judeu na Alemanha nazista. Somente cegueira ou deliberada falsificação são capazes de negar a historicidade deste genocídio e suas evidências. Cristãos e judeus estão unidos pela fé no mesmo Deus. Confessam-se ambos criaturas da bondade divina. Aplica-se ao anti-semitismo o que vale com respeito a todos os males: importa resistir aos inícios.
Todas as formas de racismo têm causas. Elas podem ser de ordem psíquica: pessoas de outras raças inspiram medo, inveja, insegurança. Ou as causas são de natureza econômica. Na Europa as manifestações racistas são especialmente fortes em áreas com alto índice de desemprego. No Brasil a onda de violência tem causas predominantemente sociais. O empobrecimento, a miséria, a desintegração social estão na origem dos seqüestros, dos arrastões, do tráfico de drogas, dos assaltos. Mas em nosso país as condições externas também poderão dar origem a ideologias racistas ou facilitar-lhes a penetração. Os extremismos se aproveitam da frustração das pessoas, criam "bodes expiatórios" e os expõe à agressão. Nem sempre, porém, as causas do racismo podem ser claramente identificadas. Residem também em valores transmitidos pela educação, em determinadas experiências de vida ou outros fatores. Seja como for, racismo permanece sendo um mal com conseqüências extremamente perigosas para a sociedade e a humanidade.
A Igreja (cada uma de suas comunidades, instituições, famílias e indivíduos) deve ser a profetiza de primeira hora e de todas as horas, para que, aliada a segmentos da sociedade brasileira, combata as expressões racistas. Inclusive as presentes em suas próprias fileiras. Parceria fraternal entre raças, culturas e etnias, também no Brasil permanece sendo um alvo a perseguir, a despeito dos inegáveis sucessos havidos no complexo processo de integração das diferenças. Como cristãos e cidadãos temos o dever de nos opor aos indícios do pensamento racista e de colaborar na eliminação dos fatores que o produzem ou oportunizam. Diz a Bíblia: "Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom" (Gn 1:31). Proíbe-se ao ser humano desprezar o que Deus revestiu de tamanha dignidade."
Cremos que em Cristo somos todos um. Um só povo, um só coração, uma só fé, um só Senhor...
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